quinta-feira, 14 de junho de 2012

RELATO DE UM CASO

Essa semana atuei em um caso atípico, mas que para mim, foi muito importante, na verdade um dos mais marcantes da minha vida.
No mês de dezembro do ano de 2011 fui contratado por um jovem de 19 anos à época do crime, e que estava sendo procurado pela polícia por estar sendo acusado de assalto, e diga-se que foi realmente um crime onde repercutiu na imprensa e o pior, deixou sequelas nas vítimas muito intensas.
Nesta semana foi marcada audiência de instrução e julgamento, anterior a esta data tinha me deslocado até o presídio para conversar com o cliente a respeito dos detalhes do caso dele.

Quando fiz meu juramento de advogado, prometi a mim mesmo nunca mentir, muitos acham isso impossível, ser advogado e não mentir, mas eu declaro aqui que é SIM POSSÍVEL e eu atuo dessa maneira e sou muito feliz em meus resultados. Advogado não é sinônimo de absolvição, de lutar pra vencer tudo, advogado que é advogado luta por justiça e a verdade deve prevalecer, agora a decisão é sua, o seu cliente pode pedir pra você negar e sustentar uma mentira ou você pode convencê-lo de que assumir é mais conveniente. Claro que em um caso em que não há provas, e você age dentro do que a lei fala, mesmo você sabendo que seu cliente é culpado, mas nada pode condená-lo, você pedirá ABSOLVIÇÃO POR FALTA DE PROVAS, você está agindo dentro da lei, ou seja, eu atuo dentro da lei e principalmente dentro da verdade

Voltando ao assunto, quando me dirigi até o presídio eu tinha em mente tentar convencê-lo de que a verdade seria melhor, conversei e ele ainda tentou relutar, ficou na dúvida se seria melhor ou não e eu falei a ele: " olha se você quiser negar e procurar um outro advogado fique à vontade, você decide o que fazer".

Conversamos até que ele aceitou e chegamos a um acordo. No dia da audiência foram ouvidas as testemunhas, as vítimas e no final o acusado. Durante o depoimento das vítimas houve muita contradição dos cônjuges que foram vítimas desse caso, a esposa afirmava que meu cliente estava sem blusa e no depoimento do marido eu perguntei a ele a cor da estampa da camisa do acusado e ele disse que não lembrava porque ele estava com o corpo todo coberto. Só estando lá mesmo para acreditar no que aconteceu lá... Eu tinha muitas e muitas armas para tentar uma absolvição para o meu cliente ja que as vítimas estavam com versões muito diferentes e não haveria de maneira nenhuma de reconhecer o acusado, mas mesmo assim eu preferi continuar com a minha tese e achei que aquilo seria o certo. Pedi um intervalo ao Juiz e fui conversar novamente com o acusado e expliquei tudo o que estava acontecendo e disse a ele que seria melhor continuarmos com nossa tese, ele prontamente concordou comigo e continuamos.

Por volta da metade do interrogatório das vítimas elas citaram o nome de "fulano" afirmando que ele teria participado também do assalto juntamente com o meu cliente, disseram que o reconheceram pela voz, porém eu como advogado sabia da verdadeira história pois obriguei o meu cliente a contar tudo, inclusive o nome dos que participaram com ele e ele me disse. Todos estavam com capuz e o nome citado pelas vítimas não teve nenhuma participação, inclusive o acusado disse que nem conhecia ninguém por esse nome, afirmou não somente perante o juiz mas a sós comigo na sala da OAB. 

E muitas coisas mentirosas começaram a surgir, e muitas ferramentas estavam aparecendo em minhas mãos para que nas alegações finais eu pudesse atacar quem sabe até pedindo uma absolvição. Mas eu preferi continuar com a minha tese. Ao final o meu cliente foi interrogado, contou detalhes do crime, contou tudo, somente não entregou os outros que participaram pois temia por sua vida e eu o aconselhei a assumir o que ele fez e detalhar a sua participação ( só para deixar claro, todos os outros estão presos), ele foi sincero e no meio das perguntas eu o questionei se ele estava arrependido e ele chorou bastante, dizendo que sim... aquilo tocou a sala de uma maneira muito forte, juiz e promotor também se espantaram pois com as contradições, capuz nos acusados, e todas as informações que poderiam fazer com que eu buscasse uma absolvição para o meu cliente, eles ja estavam se preparando para rebater também todas as minhas alegações. Até que o acusado diz:" SIM FUI EU EXCELÊNCIA, EU PARTICIPEI SIM DESSE ASSALTO".

Pronto, foi uma bomba na sala, pois todos esperavam o contrário, a sala estava cheia de alunos, juiz e promotor nada mais perguntaram e eu simplesmente fiz perguntas para demonstrar a conduta real de arrependimento do acusado. E diferente do que possam pensar, não foi armação, não foi fingimento, nada disso, foi sincero mesmo. Nas alegações o MP pediu a pena mínima ao acusado, onde o Ilustre Promotor da 4a vara criminal, o qual admiro bastante por ser um homem íntegro e honesto, reconheceu o lado humano do acusado e assim fez suas alegações finais.

Em seguida fiz as minhas, onde pedi a condenação também no mínimo legal. Na sentença o juiz se manifestou de forma diferente, analisou a conduta as circunstâncias do crime e discordou das teses da defesa e do próprio MP. Porém ao final o juiz disse o seguinte: " Sr. Fulano, você me parece querer mudar de vida,  parece realmente estar arrependido, analisei muito bem o seu caso e a pena que eu tinha para você era de mais de 12 anos de cadeia, as circunstâncias de tudo são terríveis e imagine se isso fosse com sua família... Enfim, pelo seu comportamento atípico diminuí a sua pena no máximo que eu pude, pois vejo que você foi homem em assumir e o seu advogado também, me admira a atitude em convencê-lo a assumir de forma humana e de fato nota-se que você tem um bom caráter apesar desta conduta errada praticada"

Bom, finalizando esta história, as emoções não tem como serem transcritas aqui, mas quem estava lá sabe. Mas o mais legal de tudo foi saber que ainda existem pessoas boas que cometem coisas erradas, mas que podem sim mudar e se arrependerem dos seu erros, esse meu cliente é um exemplo disso, ele ficará apenas 10 meses preso, no regime fechado, mas me agradeceu muito, a família também e isso é que me motiva a ver a justiça ser feita, com a VERDADE E COM SINCERIDADE!!!

Não se venda por dinheiro, se você é advogado seja honrado, o dinheiro não é tudo, mas você aconselhar uma pessoa para que ela se arrependa e quem sabe estar mudando todo o caminho errado que ela trilhava, isso dinheiro nenhum no mundo paga!

Não se venda!! Advogado é sinônimo de JUSTIÇA!!!



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